quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Era uma vez...

Nasceu menino de todo, atrapalhado como ele só. Tinha, vez por outra, a sensação de que poderia tropeçar nas próprias pernas. Sua angústia era sobreviver até o final do da sem se machucar muito. Jogar bola, não era com ele e por isso sempre estava no gol ou na reserva... gandula não, ser gandula humilha muito.

Mas ele foi crescendo e as pernas ganhando mais tamanho e os passos ficando mais firmes e com isso sua tranquilidade chegava. Ele era agora um jovem adulto que já não tinha mais a vergonha de ser meio desengonçado e atrapalhado. Sua insegurança foi guardada no fundo do baú de brinquedos e ele ficou torcendo para que sua mãe a levasse embora junto com os brinquedos recolhidos todo ano na época do natal.

O rapaz perdeu o peso que ganhara nos anos de desengonçado. Começou a descruzar os braços na praia, tirou o aparelho dos dentes e logo se sentia confiante nele mesmo. Pronto para encarar o que viesse, do jeito que viesse.

Começava então sua época de namoros. E ele logo descobriu a força que tem no beijo da mulher desejada. Cada beijo era único, intenso e vinha acompanhado de abraços e carinhos infinitos que fazia seu coração, esse ainda desengonçado, bater fora de compasso. Era tudo tão intenso que ele logo se dedicou a arte de amar. Namorou muito, sempre em busca do frio na barriga e do beijo mais doce e intenso que ele pudesse dar e receber.

Os anos se passaram. A busca continuou, mas já não era a mesma coisa. Quando jovem os beijos dados com amor e paixão eram devolvidos da mesma forma. Mais velho, o que ele recebia de volta eram beijos mais maduros, mais balanceados, mais cheios de questões... e muito mais chatos. Mesmo assim ele continuou buscando e chegou mesmo a se casar com a mulher que lhe deu além de beijos a filha amada, mais importante e intensa e desejada do que qualquer beijo de qualquer pessoa.

Os anos tornaram a passar e ele envelheceu mais um pouco. A filha ganhou personalidade, os beijos com a mulher rarearam e logo ele se viu solteiro de novo. E seguiu na sua busca já sem acreditar que poderia de novo sentir o que sentia nos primeiros beijos.

Os anos nem precisaram passar novamente e ele encontrou uma mulher por quem o coração batia forte, as mãos tremiam, a boca não se fechava transbordando sorrisos de felicidade, a cabeça não pensava de tanto encanto e os beijos... bom os beijos eram lindos como pôr-do-sol, gostosos como sorvete no verão, molhados como cachoeira no mato, desejados como parque de diversões. Eram ainda maiores e melhores do que qualquer outro beijo de qualquer outro tempo.

E perdido no encontro desses beijos, ele não cuidou de olhar o mundo caindo por todos os lados. Acreditou que o beijo os protegeria. Não cuidou de medir palavras, achou melhor buscar apenas os beijos. Não se deu conta que havia mais coisas acontecendo... para ele só havia o beijo e o seu incrível poder de fazer amor como quem faz bolinhas de sabão. E a vida os separou, sem que houvesse uma grande cena final, sem o drama dos filmes épicos, sem música triste ao fundo... ela apenas os separou.

E então ele voltou a cruzar os braços na praia, a tropeçar nas próprias pernas e a sentir-se um desengonçado do amor.

Mas o tempo e os anos sempre passam... e, aos poucos, ele descobriu que tinha que começar tudo de novo, primeiro aprendendo a lidar com o tamanho das próprias pernas, depois aprendendo a pisar com mais firmeza, então encontrando em si mesmo as razões para se gostar mais e depois seguindo em frente, torcendo para que a mesma vida que lhe tirou o amor maior faça a gentileza de devolvê-lo.

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