sexta-feira, 29 de junho de 2012

Maldita Agonia


E se você morrer

E se antes não estivermos juntos
ainda que só mais uma vez

E se ninguém me contar

E se não me deixarem chorar

E se nunca mais eu puder falar
o tanto que só senti por você

E se não puder mais amar você
não por não querer
mas por você apenas não existir

E se ninguém nunca mais na minha vida
mexer tanto quanto você mexeu

E se os sonhos que sonhamos juntos
virarem de repente pesadelos e torturas

...

E se você morrer

E se souber que poderia ter salvo sua vida

E que só não fiz porque não estava a seu lado

E se você tiver escrito um adeus

E se eu tiver que ler

E se nele estiver escrito como poderia
ter mudado nosso destino

E se isso for simples

E se tiver que olhar suas fotos

E se nelas você estiver sorrindo para mim

E se tiver que ver as memórias

E se tiver que mudar minhas preces

E se eu não souber

...

E se você morrer
sem que eu tenha pedido desculpas
e sem ter desculpado você seja do que for

E se nunca mais puder lhe achar linda
nem hoje, nem nunca mais

...

E se você morrer antes de mim


Maldita agonia.

Caminho de Poeta


Por entre a névoa daquela manhã de inverno o Poeta caminhava pensando. E seguia, olhando apenas para seus próprios pés, imaginando quando ele conseguiria encontrar um momento de lucidez no meio de tanta poesia. Dizia para si mesmo que já não era mais possível imaginar um mundo perfeito à frente. Encontrava seu dilema entre os dois lados da sua moeda particular.

- Quero ser quem eu sou. Sou feliz do jeito que sou. Gosto de me apaixonar e de acreditar que dessa vez será diferente. E é. É sempre diferente, mas nunca é o amor definitivo que sempre procurei e tão logo descubro isso fujo e fujo rápido para não correr o risco de me contentar com menos do que eu sempre quis, sempre sonhei. E por isso mesmo sigo sozinho.

A dor de acreditar e investir num ideal era chamada por todos os seus amigos de infantilidade, imaturidade, imbecilidade. Mas ele não se importava e, de tempos em tempos, declarava em alto e bom som: - Encontrei! Encontrei a mulher da minha vida, para logo depois ter que desdizer. Foi sempre um preço muito alto a pagar. Escolheu sempre o caminho do amor e evitou sempre a comodidade dos amores de conveniência.

- Deixar crescer... todos me dizem que tenho que deixar crescer e eu só me lembro da música adolescente que repetia o mesmo tema: “Let it Grow, let it grow, let it grow”... Mas para deixar crescer preciso de alguém que sinta como eu. Não posso deixar crescer algo que vá contra a minha natureza. Será que ainda tenho tempo para isso? Será que é tudo isso em vão? Será que nada vai acontecer?

O sonho de poeta não permitia que ele se despisse dessa roupa e buscasse um caminho mais calmo como quase todos a sua volta haviam feito. O sonho de poeta lhe oferecia a possibilidade de sentir diferente, de vier diferente, de ser diferente daquilo tudo que todos passaram a vida toda dizendo que ele teria que sentir, que viver e que ser. Sua poesia já não estava mais nas letras arrumadas em palavras, ele as havia abandonado. Preferiu viver a poesia e transformar sua própria vida em um imenso poema de amor. Que missão complicada, pensava ele. Que escolha mais sem sentido. Que diferença faz?

- Chega de poesia! Serei apenas mais um. Encontrarei uma namorada que tenha mais qualidades que defeitos e aprenderei a relevar os problemas e a valorizar apenas as coisas boas. Farei como todos fazem. Criarei na pessoa que eu escolher a fantasia que não pude viver. Chega de poesia! Buscarei o amor prático e a companhia para a velhice (que não tarda) e seguirei minha vida como todo mundo segue a sua. Não serei mais infantil, imaturo, imbecil.

E, enquanto repetia isso para si mesmo, sentia crescer a imensa dor de abandonar sua fé nos sentimentos que ainda não sentiu, nas poesias que ainda não viveu, nos ideais que ainda não se realizaram. A dor lhe tomava de assalto, em defesa da poesia. Dentro dele a angústia crescia. Sua razão e sua emoção haviam rompido relações.

... ... ...

Por entre a névoa daquela manhã de inverno o Poeta seguia caminhando e pensando. Até que o mar veio lhe acariciar os pés e o sol que despontava por de trás da montanha veio lhe beijar o rosto. No céu, os pássaros davam vida à natureza que ele tanto admirava e logo um sorriso aberto preencheu seu rosto. E ele se emocionou com o tanto de vida que cabia em um momento tão curto. 

Deu adeus à razão e seguiu seu caminho de poeta.



quinta-feira, 28 de junho de 2012

A Vida sem Amor é uma Merda


Coloque uma boa música pra tocar no computador e comece a escrever. As ideias aparecem mesmo sem serem convidadas. Logo é uma festa de palavras. Umas conversando com as outras, algumas cheias de reticências... outras de pontos e vírgulas; mas todas elas aparecem... surgem do nada, mas surgem.

...   ...   ...


O poeta tinha uma mãe especial. Uma mulher diferente de todas as outras que ele conheceu. Alta, magra e de uma elegância que a destacava onde quer que estivesse. A mãe do poeta era linda, como são lindas todas as mães de todos os poetas.

E o poeta não apenas amava sua mãe e via nela um exemplo de mulher, como também a acompanhava aonde quer que ela fosse. Quando ela dizia: - Vou ao supermercado, ele corria para se arrumar e ir junto. Mesmo quando os programas eram muito chatos para ele, ele estava lá.... fosse para o que fosse como... comprar roupas, ir ao cabeleireiro ou qualquer outra coisa que as mães fazem. Apenas a oportunidade de estar junto dela era o bastante para que ele quisesse marcar sua presença.

A mãe do poeta recomeçou os estudos tarde na vida e por isso tinha amigas e amigos mais jovens. Algumas vezes o poeta menino ia junto com o motorista para pegar sua mãe na faculdade. Dava um jeito de sair do carro e ir procurar sua mãe entre as salas. Quando encontrava, entrava na sala e sentava-se quieto ao lado da mãe que sempre esboçava um sorriso cúmplice. Havia também os terríveis momentos em que as amigas, normalmente as mais velhas, se divertiam apertando as grandes bochechas do poeta menino – pouca coisa na vida o irritava mais.

A melhor amiga da mãe do poeta era de outra cidade, aliás, da mesma cidade de onde vinha sua mãe. Quando ela vinha visitar era uma festa. A amiga tinha o incrível poder de transformar sua mãe em uma menina. A amiga bebia o dobro que sua mãe e fumava o dobro também e ainda por cima falava os palavrões que o poeta, menino ainda, não conhecia. Uma verdadeira aula que ele aproveitava como se fosse um sorvete de chocolate do Morais.

Em uma dessas visitas, a amiga da mãe hospedou-se no Copacabana Palace e o menino foi com o irmão e com a mãe visitá-la. A piscina do Copa era o melhor programa daquele tempo. Ele já ia pronto para nadar sem parar durante o maior tempo possível. Só parava para tentar ouvir um pouco da conversa dos adultos, tomar um gole de um suco ou roubar uns pedacinhos do maravilhoso filet aperitivo que só havia no Copa.

- Quem quer dar um pulo na praia? Perguntou a amiga da mãe. Ele logo se preparou, era sempre o primeiro a topar qualquer convite, fosse para o que fosse. Levaram algumas toalhas e atravessaram o calçadão rumo a praia que encanta até hoje todos os turistas que vem ao Rio. Lá, ela disse que queria comprar um biquíni novo e parou logo o primeiro vendedor que passou. Olhou, olhou, escolheu, escolheu e pronto. Decidiu-se por um biquíni mais moderno e mais escandaloso do que os que ela tinha trazido de São Paulo.

- Bom, agora preciso trocar de biquíni, disse ela. Os olhos do menino poeta se esbugalharam e ele não se conteve: - Aqui???? E ela riu alto, como sempre ria e disse: - Mas é claro que sim. Cada um pega uma toalha e vamos fazer uma cabine para eu trocar de biquíni. E logo o menino e mais duas pessoas juntaram 3 toalhas em volta daquela figura impar enquanto ela arremessava primeiro a parte de cima do biquíni e em seguida a de baixo, para delírio de quem passava por lá.

- Podem baixar, disse rindo e o menino baixou rápido encontrando a amiga de sua mãe em um biquíni supermoderno e sensual. Nossa, está demais – pensou ele, sem dizer.

Depois voltaram ao Copa, onde ela queria mostrar sua nova aquisição e desfilar pela piscina escandalizando os falsos moralistas de plantão e chamando a atenção do Ibrahim Sued que passava as tarde por lá. Bomba, bomba, bomba!

O menino poeta, depois de recuperar o fôlego e ainda sem entender bem o que sentia, achou melhor dar um tempo na piscina. Sua mãe e os demais amigos aproveitavam o sol e o ambiente tomando doses semi-industriais de gin tônica – a bebida perfeita para ser tomada na beira de qualquer piscina e em qualquer lugar do mundo.

Os risos aumentavam, a diversão era imensa e aquela alegria logo trouxe o menino poeta de volta para perto da mãe. Ele queria ouvir mais do animado papo e a amiga já não media mais o que podia ou não dizer na sua frente. A tantas horas ela contou um caso de um amor tórrido que tinha acontecido com ela e o menino ficou petrificado. Ele nunca havia escutado tantos detalhes de um romance tão excitante e, imóvel para que não fosse notado, permaneceu fixado nas palavras que saiam da boca da amiga de sua mãe.

Quando ela notou o estado do menino riu. E disse: - Querido, aprenda uma coisa pro resto da sua vida: a vida sem amor é uma merda!

E ele aprendeu.


quarta-feira, 27 de junho de 2012

Vem coisa boa por aí.


Sinto no ar. 

O cheiro das coisas boas vem preenchendo todas as manhãs dos últimos dias. É um fato: vem coisa boa por aí. Tenho que respeitar os sinais e eles nem sempre são tão claros quanto eu gostaria, mas eles estão lá, basta ver, basta me dar conta de que eles sempre chegam antes para avisar sobre o que está por vir.

Vem coisa boa por aí.

Sentado na minha mesa de trabalho, teclando no computador, vejo uma borboleta amarela entrar pela janela. Fica apenas o tempo necessário para ser notada, percebida, admirada, querida e desejada. É um sinal. Sinal de que os tempos estão mudando. Sinal de que estou encontrando meu ponto de equilíbrio em mim mesmo e não nos outros. É um sinal.

Penso com vontade em algo bom e sou surpreendido com algo melhor ainda acontecendo. Saio de casa em dia de chuva e peço um pouco de sol e ele vem. Sinto vontade de não me sentir sozinho e, no caminho de casa, os amigos aparecem e me chamam para perto.

Ainda sinto um vazio grande dentro de mim, mas sinto também que vem coisa boa por aí. Talvez essa seja a melhor maneira de me convencer que sigo no caminho certo apesar de tantas vezes ter buscado atalhos que não me levaram a lugar nenhum e ter voltado e começado de novo. Pode ser. Mas mesmo assim prefiro acreditar que não é só na minha fantasia que as coisas estão acontecendo. Acredito firmemente que minha única opção é me manter fiel às coisas que acredito e seguir no caminho que escolhi, certo de que ele me levará ao lugar que quero, mesmo sem saber qual é.

Sigo escrevendo e me expondo na esperança de que as pessoas que só me conhecem de “obas” e “olás” entendam o que vai por dentro de mim. Afinal, minha vida tem tantas histórias e estou tão acostumado a ser julgado e condenado sem direito de defesa que preciso me permitir um escape, uma forma de mostrar um “eu” que as pessoas não só não conhecem como também não fazem a menor questão de conhecer.

Acho que já contei que outro dia um amigo me disse que não aguentava mais me defender. Achei graça e disse para ele parar de me defender. As pessoas só falam de mim porque não tem nada para falar delas mesmas ou porque é mais fácil julgar e condenar do que tentar entender. Mas isso não é um problema meu, é problema delas.

Não é que eu fique triste ou magoado com a opinião alheia. Ela pouco me importa na verdade. O que me importa é saber se estou ou não dando o melhor de mim para as pessoas, se estou ou não botando para fora as coisas que eu acredito. Ou se, por outro lado, só estou mostrando meu cansaço e irritação. Não quero fazer isso e não quero deixar de tentar fazer melhor.

Vem coisa boa por aí.

Os últimos tempos não foram fáceis. Muitos baixos e muitas baixas na vida. Não reclamei com ninguém. Não me fiz de coitado. Não chorei enrolado nas cobertas a má sorte que me fez companhia por um tempo. Não entrei em depressão e nem cogitei essa possibilidade. Lutei de todas as formas para me superar todos os dias e me levantar de novo. Lutei com vontade para ver as coisas de outra forma e para lidar com o que acontecia de uma maneira sadia, lúcida, digna.

A vida continua mais dura do que precisava ser, mas a sensação é de vitória. Sinto que a luta valeu a pena, que escolhi as melhores armas, que segui minha melhor intuição e que estou cada dia mais perto de um outro tempo. Tudo isso me ajuda a seguir no caminho.

No campo emocional, sigo incompetente. Sigo com o vazio. Mas sigo.

Não estou mais parado esperando que o passado bata na minha porta e me diga que voltou. Isso não acontecerá e nem quero mais que isso aconteça. Prefiro que o passado fique longe. Só me interesso pelo futuro. Tenho certeza de que ele guarda o melhor e, por isso, sigo.

Vem coisa boa por aí. Quando chegar, eu aviso.

Para Viver Um Grande Amor

Acordei com essa música na cabeça... só mesmo o Poetinha (com "p" maiúsculo) para dar uma receitinha infalível "para viver um grande amor". Só Vinícius foi sábio o bastante para cantar em verso e melodia sua forma de ser, seu crença no amor e sua necessidade de não andar só.

Quanto respeito ele tem pela mulher amada, que lindo culto à simplicidade do amor, à importância das flores, ao entregar-se de verdade e ao "ser de sua dama por inteiro". E isso tudo de um homem que amou tanto, tanto, tanto que nem sei quanto.

Valeu Vinícius... obrigado por me fazer acreditar que é importante me manter fiel ao que acredito fundamental para viver um grande amor, ainda que ele tarde.

Sua benção Vinícius.



segunda-feira, 25 de junho de 2012

Você vai para o Rio?

Eu estava na sala de embarque da ponte aérea, em São Paulo, com o rosto enfiado dentro de um jornal e mal percebia o movimento do salão. Pra variar não tinha nenhuma novidade que valesse a pena ler, mas mesmo assim eu tinha que ajudar o tempo a passar de alguma forma.

De repente sinto que alguém senta-se ao meu lado. Não acusei o golpe. Fiquei como estava. Não olhei para o lado e não fiquei curioso pra saber quem invadia a minha tranquilidade. Até que uma voz de mulher me pergunta: - Você vai para o Rio? Por uma fração de segundo pensei que ia ter que aguentar uma chata me fazendo perguntas nada inteligentes como aquela. Afinal, dentro da sala de embarque da ponte aérea, pra onde mais eu poderia estar indo. Respirei fundo, fechei o jornal e educadamente tomei o fôlego necessário para responder enquanto virava o rosto para olhar nos olhos da minha mais nova companheira de viagem. Já tinha escolhido as palavras e já me preparava para soltar uma a uma numa sequência capaz de organizar o óbvio da melhor forma possível. Mas a medida que eu virava a cabeça ia percebendo que a mulher do meu lado não era apenas "uma mulher" e sim uma das mais bonitas que eu já vi de perto na vida. As palavras forma subindo uma nas outras bem perto da minha boca porque todas elas queriam ver a moça ao mesmo tempo e eu gaguejei.

- Vo..o...o...o...u. Foi o que consegui dizer de mais inteligente.
- Posso viajar do seu lado. É que eu tenho medo de avião.

Calma garoto. Muita calma nessa hora. Você quer, você pode, você consegue. Era o que passava pela minha cabeça enquanto eu buscava conter meu surto de encantamento e proibia as palavras de saírem trocadas ou antes da hora. Me concentrei em ficar tranquilo e levar aquilo como se fosse a situação mais normal do mundo. Afinal, era só a mulher mais linda que existia me pedindo companhia para viajar, nada demais.

- Claro que pode. Viajo muito e desde pequeno. Vou adorar sua companhia. Esse jornal não fala a minha língua mesmo. Fechando e largando o jornal de lado enquanto ela esboçava um sorriso, e que sorriso.

Ela me disse se chamar Cristiana e eu me apresentei também. Perguntei o que ela fazia e ouvi o relato de uma atriz em busca de um papel. Ela já havia desfilado como modelo e feito algumas aparições sem destaque em peças e programas de TV. Nada que empolgasse muito. Mas nem por isso ela se mostrava desiludida ou cansada de tentar. Havia nela uma excitação pela busca do futuro. E isso era tão forte que me parecia motivada por algum anti-depressivo da moda.

O auto-falante anunciou que a Varig, em nome das companhias que compõem a ponte aérea, tinha o prazer de nos convidar a embarcar. O vôo estava vazio e seguimos pela pista até a escada que nos levaria ao Electra.

Aqui vale uma pausa para dizer que tudo isso aconteceu em uma época em que o Electra era soberano na estrada aérea que ligava o Rio e São Paulo. Neste tempo só não era permitido fumar na pista por onde se caminhava até chegar na moderna escada de alumínio que dava acesso a aeronave. O Electra era lindo e, no fundo havia uma espécie de sala que os habitués frequentavam e onde se tomava um whisky honesto e fumava-se desbragadamente. Era delicioso. Mas naquela viagem optei por sentar nas poltronas ao lado da moça linda.

Engatamos uma conversa na outra e depois em mais uma e numa terceira. Foi tão rápido que não percebemos o tempo passar, literalmente voando.

- Senhoras e senhores, dentro de instantes estaremos aterrissando no Aeroporto Santos Dumont no Rio de Janeiro. Queiram, por gentileza, colocar sua poltrona na posição vertical, atar os cintos e não fumar. Verifiquem o travamento da mesinha a sua frente e permaneçam sentados até o completo estacionamento da aeronave.

Era noite e a pista iluminada do Santos Dumont acendia todos os meus sentimentos. Olhei para a janela desviando meu olhar daquela linda mulher pela primeira vez desde que a vi e pensei: - Como posso estar apaixonado em menos de uma hora? Isso é um novo recorde. Enquanto pensava nisso ela me dizia algo que não consegui ouvir direito. Pedi para que repetisse e ela me falou: - Posso segurar sua mão? Tenho medo da aterrissagem. Um momento sublime este em que nos tocamos pela primeira vez.

O pouso foi muito tranquilo, mas as mãos permaneceram entrelaçadas mesmo depois do completo estacionamento da aeronave e no meio da movimentação dos apressados passageiros, sempre afoitos para sair do avião. Um silêncio tomou conta da cena e os dois pareciam querer guardar na memória aquela sensação boa. Apenas quando o desembarque já estava acabando foi que eles se moveram e seguiram o fluxo em busca do imenso saguão do aeroporto e, depois, das malas - que eram colocadas uma a uma no mesmo salão.

O caminho de nós dois era o mesmo e o táxi também foi o mesmo. As mãos voltaram a se encontrar e o beijo fez parte daquele caminho pela cidade maravilhosa. Ela ficou em casa e eu segui com o coração batendo forte.

Quis a vida que nós não conseguíssemos nos encontrar mais do que uma ou duas vezes depois disso. Na primeira, ela estava deprimida e fui levar um livro emprestado. Bom, não era apenas um livro, era meu livro preferido: Uma Alma Livre, a história do poeta que eu tanto amava, tão cheio de vida, tão alegre que era capaz de transformar qualquer vida. Ela sumiu, o livro também. Meses depois ela estava nas telas com o maior sucesso da TV daquele tempo. A linda mulher se transformou em protagonista, foi morar um tempo no Pantanal e eu nunca mais soube nem dela nem do meu livro.

(Ganhei um novo exemplar, anos depois, graças ao meu pai incansável na busca em todos os sebos do Brasil até me provar que sempre é possível recuperar as coisas perdidas.)



domingo, 24 de junho de 2012

Uma imagem vale mais do que mil palavras...


Minha amiga Bebel Franco fez essa imagem para a ilustrar a coluna da Danuza na Folha de S. Paulo. Quando ela me mostrou pedi para usar no blog porque achei ela rica e cheia de significados.

Ia começar a filosofar...parei... fica a foto. Ela fala sozinha!

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Você tá feliz? (ou Conversando com os meus Botões)

Esse é o original que eu postei em 15 de novembro de 2010


- Oi. tudo bem?
- Tudo...e você...há quanto tempo a gente não senta pra bater um papo.
- É verdade, mas olha só: eu te conheço...tá tudo bem mesmo?
- É difícil mentir pra você, né?
- É que a gente se conhece há muito tempo.
- É verdade. Na verdade ando meio triste, mas com medo de falar isso pras pessoas.
- Por que?
- Sei lá. Acho que falar isso assuta as pessoas. E, vamos combinar: não tem nada mais chato do que responder pra alguém que te pergunta se tá tudo bem com um - Não cara, não tá não...risos
- É. Não dá pra falar com todo mundo mesmo, mas você tem amigos, família. Tá namorando?
- Tenho família e amigos sim e parece que tá todo mundo cheio de problemas ao mesmo tempo...difícil encontrar o jeito e a hora certa de pedir ajuda...
- E logo você que nunca soube pedir ajuda, né?
- Nunca. Mesmo criança pra mim era muito difícil pedir ajuda pra minha mãe ou pro meu pai.
- Entendo...mas você não me respondeu: você tá namorando?
- Ihhhh... tá com tempo? risos
- Tá bom, já entendi que você prefere não falar sobre isso, né?
- É que alguém pode ouvir e entender do jeito errado e aí fica tudo ainda mais esquisito...
- Bom, e o que você tem feito de bom?
- Eu? deixa eu pensar...feito de bom...ah, já sei: planos! muitos planos!
- Risos. Palhaço. Não é isso o que estou perguntando. Você tem viajado? Como anda sua filha? Tá com projetos novos?
- Eu sei, eu sei...bom, é assim: só tenho viajado para o Rio. Minha filha está uma mulher, meu maior orgulho. Tô no meio de um projeto muito legal, com gente que eu admiro muito.
- Que bom. Fiquei com medo de que você fosse entrar numa puta depressão depois do ano que você teve...
- Eu também fiquei com medo, por isso acordava todo dia com vontade de fazer alguma coisa legal. Acordava com um sorriso no rosto, pensando no que eu podia fazer, como fazer diferente, aonde ir, etc. Briguei contra a tal da depressão. Mandei ela pra bem longe. Mas eu nunca conseguiria fazer isso sozinho.
- Ah...então você pediu ajuda!?!
- Pedi pra poucas pessoas. Alguns amigos me conhecem tão bem que não precisei pedir. Outras pessoas que eu mal conhecia também surgiram do nada pra oferecer a mão. Isso é bom demais!
- Bacana cara. E agora? quais os seus próximos passos?
- Pergunta difícil...deixa eu pensar. Bom, acho que o primeiro passo é valorizar as pessoas que amo e que fazem parte da minha vida. Não adianta ficar só pensando nas coisas que eu perdi...depois é como dizia a música...manter a mente quieta, a espinha ereta e o coração tranquilo.
- Mas, você tá feliz?
- Quando eu era menino escrevi uma poesia que se chamava: Ser Feliz...lembro pouco dos versos, mas tinha umas coisas como...Ser feliz é ser amante e mais que isso é ser amado. É não sofrer um só instante. E é ser simples sem ser vago.... to tentando amigo, to tentando.
- Que bom! vai nesse caminho que você vai bem.
- Obrigado! É sempre bom falar com você!
- É sempre bom estar por perto.
- Tchau, um beijo!
- Tchau, outro!

Você tá feliz? (ou Conversando com os meus Botões) II

Tem um tempo e eu escrevi um papo de mim comigo mesmo como uma nota no Facebook e até hoje eu repito este mesmo ritual...

- E aí? Cara tem muito tempo que a gente não conversa. Tô com saudades.
- Oi! Também tô com saudades.
- Me conta. Como estão as coisas pra você?
- Acho que melhoraram. Pelo menos consigo entender melhor o que sinto ou deixo de sentir.
- Você...sempre apaixonado, né? O que aconteceu agora?
- Nossa...tanta coisa desde a nossa última conversa. Conheci muita gente. Tive algumas namoradas mas acabei não ficando com ninguém de verdade. Sigo tentando, mas me sinto meio incompetente.
- Hahahahaha... incompetente!?! Só você! Por que você se acha incompetente?
- Porque as vezes encontro uma pessoa que encaixa completamente nas coisas que eu acredito e quero para a minha vida e mesmo assim as coisas não vão em frente do jeito que eu imagino.
- Não sei se entendi. Por que não vão em frente?
- Por que?... sei lá...não vão...
- Ei, é comigo que você tá falando...se abre. Por que é que você acha que as coisas não andam dando certo?
- Bom.. você lembra da última vez que a gente se falou? Eu tinha uma história complicada na vida, etc...
- Claro que lembro. Você ficou muito mal. Quase não segurou a onda...
- Pois é. Como te falei, eu acreditei que ela fosse ser a mulher com quem eu passaria o resto da minha vida e por conta disso, abri mão de tudo. Pedi até desculpas pelo que não fiz. Fiquei mal. Bebi muito. Fiz um monte de bobagem e estava disposto a abrir mão de tudo aquilo que eu sou só para estar perto dela mas nada disso adiantou.
- Eu sei cara, foi duro mesmo. Lembro de como você ficou e o tanto que você sofreu...
- Depois, algumas vezes, trocamos alguns e-mails. Ela me dizia que queria ser minha amiga e que as expectativas estavam fora de questão e eu não conseguia entender nada. Antes ela me dizia que precisava se resolver sozinha e que precisava ficar longe e quando veio para perto queria continuar me mantendo longe. Foi duro pra mim. Não conseguia encontrar sentido nem no que ela falava e nem em tudo que eu sentia.
- E não era pouco né?
- Não. Não era pouco. Era muito. Era mais do que eu podia controlar. Era uma explosão de sentimentos e de paixão como nunca achei que eu pudesse sentir na vida.
- E de lá pra cá... como você ficou?
- Fique muito mal. Mal de verdade. Chorei, escrevi, bebi, me reduzi a uma pessoa que eu já não reconhecia mais e que não gostava mais. Fiquei muito perto de uma depressão barra pesada e não tinha com quem compartilhar.
- Mas você não me parece tão mal hoje.
- É que depois de muito chorar e muito sofrer resolvi que eu precisava buscar um caminho para seguir a vida. Consegui tirar uns dias de férias e fiz uma viagem sozinho comigo mesmo. Foram quinze dias em que eu fui a lugares lindos, parando onde eu queria, vendo as paisagens que eu queria e conhecendo as pessoas que me chamaram a atenção.
- Mulheres novas?
- Não... não queria nenhuma situação que me colocasse em cheque. Queria ficar sozinho e queria que isso fosse o bastante para mim. Levei um livro que não li. Não entrei no computador. Não busquei nenhuma saída fácil. Fui curtir a vida. O nascer e o por do sol. Os dias lindos e os dias de chuva. As praias e as montanhas. Foi uma viagem pra dentro de mim e não para fora. Não quis, nem pensei em estar com ninguém que não fossem as pessoas que apareceram no caminho. E quem apareceu só me fez bem. Gente que me falava sobre lugares que eu precisava conhecer ou cuidados que eu precisava ter. Mas nada de paixões, amores, tesões, mulheres pra passar o tempo...nada disso. Fui só eu e eu mesmo.
- Entendo... e foi bom?
- Foi... Entendi que eu depositei sobre ela toda a fantasia do mundo mas que nunca conheci aquela mulher. Tudo o que imaginava cabia nela e ela se esforçou pra caber na fantasia, mas ela nunca conseguiu ser de verdade comigo. Acho mesmo que ela mentiu muito para mim porque era o jeito dela ser ela já que não tinha coragem de ser ela mesma para mim. E, em algum momento, ela desistiu disso e resolveu ir pra bem longe. Fugiu dela mesma ou do que poderia ser e foi viver as fantasias dela o mais longe possível.
- Isso faz sentido...se ela fosse ela mesmo, talvez você não a quisesse... é por aí?
- Hahahahaha... é o que eu acredito que ela acreditava. Acho que ela pensava que eu não sabia quem ela era, pra onde ela estava indo, o que queria de verdade...mas eu sempre vi tudo isso no olho dela e mesmo assim estava disposto a viver do lado daquela mulher pra sempre. Sempre achei que era questão de tempo para que nós dois fossemos nós de verdade. Mas acho que ela nunca entendeu isso.
- Mas não foi pra isso que você foi viajar...foi?
- Não. Fui viajar pra deixar esse sentimento ir embora. Entender que ela era feita só de fantasia. Nada nela nunca foi de verdade. Ela nunca teve coragem de ser de verdade. E viver uma mentira não é pra mim é pra gente covarde que não encara a vida. E, por isso mesmo, não estava mais disposto a esperar o sentimento se resolver sozinho.
 - Mas você teve um monte de gente...nunca esteve sozinho...
- Nisso você se engana... tentei encontrar nas outras pessoas a fantasia que coloquei nela e, depois de algum tempo, sempre me frustrava porque as pessoas de verdade são de verdade e eu estava procurando a fantasia... sempre estive sozinho nessa busca e era isso o que eu precisava entender na viagem.
- Bacana... difícil chegar nessas conclusões todas...e hoje? como você está?
- Continuo sozinho mas me conheço muito melhor. Entendo melhor o que eu senti. Entendo melhor o tanto que deixei de viver. Me entendo melhor...
- Fico feliz por você. Mas você nunca esteve sozinho...estou sempre aqui...
- Eu sei e isso é muito importante pra mim... mas não é disso que estou falando. Estou falando de construir sentimentos e relações...
- Entendo... mas não basta aprender... tem que viver a vida e isso não acontece do dia pra noite.
- É amigo... é isso... mas de vez em quando bate uma tristeza...
- Isso passa...tem que passar...

Raio de Sol


(Esse texto foi escrito em 1995 para Cristiana Facchinetti, um dos mais bonitos raios de sol que vi na vida)

Certo dia o Poeta ouviu uma estranha história sobre os índios, que ficou na cabeça dele por muito e muito tempo, até que um dia ele a colocou no papel. Era mais ou menos assim...

Era uma vez... em algum lugar, há muito e muito tempo, uma aldeia de índios, que viviam felizes no meio do mato. Os limites da vista eram os limites do mundo que existia para eles e todos na Aldeia se tratavam como uma grande família.

O programa preferido de todos eles, sobretudo das crianças menores, era sentar ao redor da fogueira para ouvir histórias diferentes, sobre mundos diferentes. Essas histórias eram sempre contadas pelo mais velho membro da Aldeia porque assim os mais novos poderiam ouvir, aprender e contá-las no futuro quando fossem eles os mais velhos da Aldeia e, as histórias não se perderiam jamais.

Num daqueles dias especiais, como sempre são os dias das histórias escritas, um pequeno índio resolveu ter com o Cacique, depois da história contada. Algumas coisas pareciam não fazer sentido e o pequeno índio achou que o Cacique poderia ajudá-lo a compreender.

O Cacique o recebeu em sua tenda, muito disposto a ajudá-lo e pronto para ouví-lo. Mas quando ele chegou  e sentou-se a sua frente, o pequeno índio percebeu que não sabia sequer por onde começaria e, logo, tentou inverter a situação.

- Querido Pai da Aldeia - nome que os Caciques ganhavam quando viravam Caciques - há tanto o que saber que eu nem sei por onde começar e, por isso gostaria que você me falasse de quando você tinha a minha idade.

- Meu filho, Promessa de Luz, quando eu tinha a sua idade não tinha sua aflição. Talvez eu possa ajudá-lo, mas você tem que me dizer o que o incomoda tanto.

- É isso mesmo !

- Como !?!

- O que me incomoda é o incômodo, o que me aflige é a aflição e o que me dá medo é o medo. Não sei como é que você acertou, assim de cara, mas é isso mesmo.

E o Cacique pacientemente viu que teria um certo trabalho em ajudar o pequeno índio e, decidiu convidá-lo para um passeio no dia seguinte, para fora dos limites do alcance da vista, fora do seu mundo. O jovem a princípio ficou fascinado: - Mas, pode ? É claro que podia explicou o Cacique. O simples fato de você não conseguir ver não faz com que as coisas não existam, se o seu problema são limites vamos começar por expandí-los.

O Cacique foi dormir e o menino foi para sua tenda rolar a noite toda em busca de um sono que nunca vinha. Na manhã seguinte, antes do galo cantar, e como cantavam os galos daquela tribo, o Cacique já estava sentado do lado de fora da cabana do pequeno índio, contemplando o amanhecer. Quando o galo cantou o menino saiu em disparada para fora e, quase caiu em cima do Cacique que tranquilamente já o aguardava.

- E então, vamos ? - Uma mistura de ansiedade e expectativa transpareciam no rosto do menino. E, foram.

Andaram por cerca de meia hora e o menino resolveu falar pela primeira vez. - Pai da Aldeia, nós já andamos bastante e o limite da minha vista parece continuar no mesmo lugar. Será que a gente não vai chegar nunca ? E o Cacique convidou Promessa de Luz para sentar pela primeira vez.

- Olhe para trás. Você ainda consegue ver a Aldeia ? E o menino virou-se, e percebeu que era impossível avistá-la, ela tinha saído do limite dos olhos dele e ele ficou verdadeiramente apavorado e levantou-se. - Mas Pai da Aldeia, será que a Aldeia não existe mais ? O que aconteceu com ela ? Foi algum Deus que tirou ela do limite dos meus ohos ? E o Cacique tentou acalmá-lo e mandou que ele sentasse de novo.

- Sabe, Promessa de Luz, a Aldeia continua no mesmo lugar, na verdade é você quem está fora do limite dos olhos dela. Pela primeira vez você está descobrindo que o limite dos olhos é um limite imposto por você mesmo e, que as coisas não existem ou deixam de existir em sua função. Isso não é bom nem mal, apenas é.

E o pequeno Promessa de Luz ficou ali sentado um tempo tentando entender as palavras que o Pai da Aldeia havia falado, até que, mais calmo perguntou: - Pai, é por isso então que de acordo com o tempo e conforme eu vou crescendo, eu consigo enxergar mais longe e fica parecendo que o mundo está crescendo comigo e, eu fico mais e mais ansioso por entendê-lo, mas nunca consigo encontrar as mudanças ?

- É isso mesmo Promessa de Luz. O mundo muda de acordo com a mudança da percepção que temos dele. Mas o mundo é e será sempre o mesmo mundo. Vamos andar um pouco mais ? E, foram.

Andaram mais uns quarenta minutos até chegarem a uma Praia deslumbrante, com águas limpas, areia branca e muitos pássaros muito diferentes. Aquela visão foi muito forte para o pequeno índio. Ele começou a berrar e a pular de felicidade, como somente as crianças sabem fazer. Assustou-se com as ondas, foi até a margem do Mar e provou a água, imaginando ser igual a do Rio que passava ao lado da aldeia e descobriu que era salgada. Entrou devagarinho e com medo, até o limite das suas pernas. Ia e voltava correndo, seguindo o intervalo das ondas no Mar. Enquanto o Cacique apenas observava aquilo tudo com muita calma e serenidade.

Quando o menino cansou e sentou-se na areia, o Cacique levantou-se e correu para o mar onde deu um mergulho formidável, daqueles que só um herói sabe dar. A princípio o pequeno índio ficou muito preocupado, será que o Pai da Aldeia estava bem ? Estava.

Depois do mergulho, o Cacique voltou para a areia e sentou-se ao lado do menino, que tinha os olhos vidrados pela emoção, e começou a falar.

- Este é o Mar, ele é maior que eu, que você, que toda a Aldeia e mesmo que o limite da vista de todos nós juntos. Sabe, Promessa de Luz, a primeira vez que eu vi o Mar, tive uma reação bem parecida com a sua, um êxtase seguido de medo.  O Pai da Aldeia daquele tempo, me levou para dentro do Mar e me ensinou a respeitá-lo, e pouco a pouco fui perdendo o meu medo. O êxtase voltou ao seu lugar e eu pude mergulhar e me entregar ao Mar da mesma forma que ele se entregava para mim. Foi maravilhoso ! É claro que antes disso acontecer, eu me enrolei com algumas ondas, tive que aprender a nadar e a mergulhar, até que um dia eu pude entrar no Mar sozinho e sem medo.

- Você está dizendo que se eu quizer, basta eu conhecer o Mar e respeitá-lo para perder o medo que estou sentindo e dominá-lo por completo?

- Promessa de Luz, o que você quer dizer com conhecer o Mar ? Parece possível para você conhecer essa imensidão ou mesmo dominá-lo ? Não parecia, e o pequeno índio ficou um tempo quieto sem compreender. Quando falou, perguntou: - Mas como é que eu posso não ter medo de alguma coisa que eu não conheço, que eu não domino e que é muito diferente de mim ?

- Só existe uma maneira. Você precisa acreditar. Acreditar em você e no Mar. O que você tem que dominar é você mesmo, o que você tem que conhecer é você mesmo. Você só tem você, e isso não é nem bom nem mal. Quanto as diferenças, nós também não somos iguais, o Céu também é diferente, o Rio é diferente, a sua cabana é diferente da minha, enfim: nada é igual, e nem por isso você deve se afastar ou temer.

As coisas começavam a fazer um pouco mais de sentido na cabeça do pequeno Promessa de Luz. Depois de um tempo meditando o pequeno pediu para o Pai da Aldeia levá-lo até o Mar e começou pouco a pouco a se entregar aos caprichos das ondas, primeiro apenas com a mão dada ao Pai da Aldeia e, pouco a pouco, sozinho começava  a se entregar. Passaram a maior parte do dia na Praia, até que decidissem voltar. E, voltaram.

No caminho de volta, o pequeno Promessa de Luz, já não se sentia tão pequeno assim e depois de uma boa caminhada, pediu para parar um pouco e sentou-se ao lado do Cacique e perguntou: - Pai da Aldeia, algo de diferente aconteceu comigo hoje. Conheci muita coisa e, sinto que há muito mais a conhecer. Tenho a sensação de estar crescendo e isso é melhor do que a aflição e o medo e a angústia que eu estava sentindo. Mas, e se um dia eu parar de crescer, esses sentimentos ruins voltarão ?

- Hoje, como todos os dias, foi o primeiro dia do resto da sua vida, e você soube vivê-lo com intensidade e descobriu muitas coisas que não conhecia. Amanhã talvez você descubra mais um pouco e depois um pouco mais ainda, e é assim que a vida é e, sempre vai ser. Não há porque temer a volta de sentimentos que podem trazer para você a certeza de que você sempre estará crescendo, assim como eu estou. É como as ondas no Mar, que nunca são iguais e não param de se repetir e mudar e evoluir. Imagine se o Mar desistisse de fazer ondas, como é que você acha que as coisas iam ficar ?

- Acho que o Mar deixaria de ser Mar, para não ser nada. Porque são as ondas que fazem dele o que ele é. É como se o Sol apagasse, ou se as árvores deixassem de dar frutos ou a grama parasse de crescer ou se as histórias deixassem de ser contadas. O Mundo deixaria de ser Mundo, para não ser nada.

O Cacique sorriu feliz por perceber que Promessa de Luz realmente tinha compreendido a mensagem, e levantaram para voltar a Aldeia. E, voltaram.


Naquela noite o Cacique pediu licença ao mais velho dos homens da tribo para contar uma história, e contou esta que está escrita aí em cima. Depois, chamou o índio para o centro do grupo e, em um ritual solene avisou a quem quisesse saber que daquele dia em diante Promessa de Luz deveria ser chamado de Raio de Sol, porque naquele dia ele tinha descoberto o seu próprio brilho, e a  promessa de luz havia sido cumprida.

Depois de colocar a história no papel o Poeta releu, mudou os erros que os poetas se permitem fazer e releu mais uma vez. Depois decidiu entregá-lo para outra Promessa de Luz, com esperança de um dia poder vê-la se transformar em Raio de Sol.

Rio, 28 de Setembro de 1995

Coração não se cansa


De amar meu coração não se cansa
mesmo que desiludido bata
mesmo que cansado esteja
mesmo contra as chances todas.

Meu coração, amigo meu,
sabe melhor que ninguém o rumo que segue.
Toca melodias que em nada lembram
os tambores ritmados e seguros,
expectativa normal, de outros corações.

Meu coração, quando esmoreço, diz-me:
levanta menino, ainda há muito a viver
ainda lhe darei sonhos e sensações
que você nem suspeita existirem;
levanta menino. Ergue a cabeça
e sente o vento batendo no seu rosto
e acredita menino: o melhor ainda está por vir

De amar meu coração não se cansa.
Talvez se canse das saudades,
talvez se canse das decepções,
talvez se canse da própria ilusão
e talvez não.



quarta-feira, 20 de junho de 2012

Boa Praça

(com carinho para Socorro Machado)

Um dia o poeta estava acordando e tomando a primeira das três canecas de café que o mantém vivo pelo resto do dia. Era cedo. O sol ainda não havia se exibido por completo e o poeta já se pôs a pensar entre um e outro gole.

Seu primeiro impulso foi o mesmo de todos os dias. Conferiu que estava vivo e agradeceu aos céus por mais um dia. Todas as manhãs ele faz o mesmo, pensa em como é bom ter mais um dia para viver e promete a si mesmo que vai aproveitar aquele dia como se fosse o último, para em seguida fazer os planos para descobrir como esse dia comum pode se transformar em um dia especial. Nem sempre é fácil, mas com o tempo fica bem mais tranquilo perceber que são as pequenas, e não as grandes, coisas que fazem a diferença entre um dia normal e um dia especial.

Logo depois, o poeta pensou com carinho na sua melhor amiga. O poeta tem a sorte de ter  uma amiga especial de verdade. Seus generosos sorrisos e sua alegria transbordante nem de perto mostram o tanto que existe dentro dela. Desde o próprio nome até qualquer uma de suas atitudes mais simples mostram que ela está sempre pronta a socorrer seus amigos.

E foi assim que o poeta lembrou-se de uma história que ele leu em algum lugar ou que ficou guardada na sua memória de poeta. Dizia assim...

Duas crianças brincavam em uma praça. Naquele tempo as praças tinham um cheiro especial que só quem brincou nelas é capaz de lembrar. A euforia de estarem lá era imensa e a pressa de aproveitar todos os brinquedos antes que alguém lhes dissesse que o tempo havia acabado era ainda maior.

Subiram logo no trepa-trepa para se mostrarem capazes de conquistar o topo para que pudessem ver a praça do alto. Era como um ritual para tomar posse do lugar que lhes pertencia por direito infantil. A praça é das crianças e do cume de um trepa-trepa isso é bem mais evidente. É de lá que elas percebem o movimento dos adultos indiferentes à tanta diversão e tantos sorrisos. Mas nem por isso a diversão acaba ou os sorrisos cessam. É de lá que eles descobrem que os dias são mais especiais do que parecem a primeira vista.

- Vamos para a gangorra?
- Vamos!!! O último a chegar é mulher do padre!

E descem correndo com uma habilidade de equilibristas de circo e correm mais ainda pelas areias com cheiro de infância até o próximo brinquedo.

Na gangorra o sobe e desce democrático faz de ambos cúmplices. Quando um sobe o outro desce, quando um desce o outro sobe. Um equilíbrio perfeito que só é possível nas gangorras da infância. Em um momento ele segura a gangorra embaixo fazendo com que sua amiga fique "presa" no alto e ambos riem alto. Ela não se entristece nem sente-se presa. Muito pelo contrário, vibra com a sensação de estar no topo do mundo e ele diz a ela que se depender dele ela sempre vai estar no alto. E a cumplicidade aumenta e a gangorra volta a mover-se para o alto e para baixo.

- Tem dois balanços livres. Vamos para lá?
- Vamos!!!!

E, com cuidado, ele a ajuda descer sem se machucar e a pressa anterior dá lugar a uma atenção necessária entre amigos. Quando em segurança, os dois correm de mãos dadas, como só as crianças correm, até os balanços que escolhem pela cor. Ele no azul, ela no vermelho.

Eu consigo ir mais alto do que você, ele avisa. Então em ensina, ela pede. E ele, que estava pronto para uma disputa, dispensa a vontade de competir pela necessidade de compartilhar seu conhecimento. E, com paciência, mostra que as pernas dão o impulso e que o tempo de jogá-las para frente e para trás é o que faz o impulso ainda maior e o balanço subir ainda mais. Ela aprende feliz e os dois aproveitam cada momento no balanço.

- Gosto quando ele está bem alto, diz ela.
- Eu também, mas se ele não descer, nunca subirá!

E os dois retomam um silêncio de palavras entre gargalhadas infantis. Ela pensa: ele tem razão. Se não descer, não sobe. Ele pensa: ela tem razão. O alto é melhor.

Um novo cheiro toma conta da cena e se mistura com o delicioso cheiro de praça fazendo com que os dois tenham a mesma ideia no mesmo momento.

- Pipoca!!!!!!!

Compram juntos um saco grande de pipoca salgada e dividem com pressa, como se toda a pipoca do mundo estivesse naquele saco.

- O pai de uma amiga diz que você só conhece as pessoas quando divide e come junto um saco de sal.
- Será que ele está falando de pipoca???
- Não sei. Mas pra mim faz sentido.

E sorriem pensando na expressão marcada do saco de sal, seguros de que se conhecem e de que passarão toda a vida se conhecendo ainda mais e melhor.

- Crianças! Tá na hora de ir embora!
- Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh - respondem os dois ao mesmo tempo enquanto olham os brinquedos e se despedem da praça com a certeza de que sempre voltarão.



terça-feira, 19 de junho de 2012

Lembranças de Aniversário - Memória Seletiva


Tive a sorte de ser afilhado de Genésio e Vanja. Duas pessoas incríveis que fizeram a minha vida melhor em cada palavra e em cada carinho que recebi de ambos. Tio Genésio morreu cedo, ou melhor, cedo comparado com ela que viveu até seus 103 ou 104 anos de idade. Tia Vanja foi madrinha de minha tia e de minha avó também, portanto ela já era uma senhora quando me segurou para o banho de água benta.

Na minha casa de garoto junho e julho eram meses de festa. Meu pai e meu irmão fazem anos em junho e eu em julho, mas como bom leonino começo as comemorações um mês antes e sigo comemorando até o ano seguinte.

Tia Vanja era uma mulher prática. Em quase todos os meus aniversários, lembro-me dela me entregando um pequeno envelope com o que ela chamava de dinheirinho de aniversário e o que achava ser uma fortuna. Ela sempre repetia que era mais fácil que eu escolhesse meu próprio presente. E aquilo se tornou um ritual que acontecia repetidamente e que me fazia sonhar com as maravilhas que eu poderia comprar com seu dinheirinho.

Mas antes disso houve um ano em que ela resolveu presentear os três aniversariantes ao mesmo tempo e mandou entregar em nossa casa uma sacola com três embrulhos cada qual com seu nome. O meu foi fácil, mas meu irmão e meu pai tem o mesmo nome e aí começou a confusão.

Tia Vanja sempre chamou meu pai pelo nome em diminutivo e na hora de marcar os presentes não fez diferente. Só que em casa o diminutivo era usado para o meu irmão e não para o meu pai, que aliás não tinha nada de diminutivo.

Meu irmão foi direto e reto para o pacote marcado e abriu avidamente o seu presente no auge dos seus treze ou quatorze anos. Era uma loção pós-barba ou um after-shave como se dizia na época. Lembro do seu rosto de felicidade com o presente que instituía sua maturidade precoce. Lembro da alegria dele em ser reconhecido como um adulto digno de se barbear. A emoção tomou conta dele naquele final de tarde e ele não parava de comemorar sua nova fase de vida.

Contou para a minha mãe, contou para os empregados e repetiu inúmeras vezes para mim que a minha madrinha era simplesmente o máximo e que ela estava sendo a responsável por um dos melhores momentos da sua vida.

Tanta alegria só durou até o meu pai chegar em casa e abrir seu embrulho. Dentro dele, um carrinho de bombeiros revelava o mal-entendido. Presentes destrocados e agradecimentos feitos ficou certo ar de decepção no rosto do meu irmão, mas ficou também uma marca na sua vida por descobrir que o homem generoso, alegre, querido e íntegro que ele é hoje estava se formando. Quem sabe no ano que vem, deve ter pensado ele.

Parabéns irmão querido! Curta seu dia!

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Os Outros São Eu

Quanta gente entendendo da minha vida... impressionante!

As coisas vão acontecendo. Todo dia acontece uma coisa nova. Conheço gente nova e sigo no meu caminho com uma única certeza a de que eu não tenho certeza de nada.

Enquanto isso, tem sempre alguém pra me dizer que eu devia isso, devia aquilo, que eu sou assim, assado, cozido e sei lá mais o que. Fico sempre me perguntando se essas pessoas, tão bem resolvidas com a minha vida, são também bem resolvidas com as dela...acho que não.

Eu me exponho demais. Isso é um fato. Mas tem razão de ser. Não é por acaso que escrevo sobre a minha vida do jeito que escrevo. Meus textos são pra botar pra fora e tentar entender melhor as coisas que acontecem todos os dias. Se eu não escrever posso acabar pirando de verdade. Sabe lá o que é guardar todas as emoções que eu sinto dentro de mim? É muita coisa. Tem hora que sinto amor, tem hora que tenho ódio, tem hora que tenho pena, tem hora que tenho nojo, tem hora que tenho horror, tem hora que sinto raiva, tem hora que sinto tesão, tem hora que sinto paz, tem hora que sinto saudades...e o dia só tem vinte e quatro horas.

Não me incomodo que meus amigos venham me dizer o que pensam ou deixam de pensar. Pelo contrário, gosto muito quando eles se esforçam pra me ver feliz. Mas esses amigos me conhecem a fundo e nem por um minuto passa pela cabeça deles me dizer que eu deveria ser de outra forma. De vez em quando até me sacaneiam e usam de um certo sarcasmo para zombar...acho graça. Gosto da inteligência das palavras bem usadas. Gosto da franqueza com que eles falam o que pensam e gosto de saber que eles me conhecem e que gostam do que conhecem.

Outro dia me expus mais do que o normal e ouvi algo como: - nossa quanta coisa tem aí dentro, não dava pra imaginar...e eu ri. Porque é claro que tem um mundo de coisas aqui dentro tanto quanto tem dentro de você que está lendo isso sem saber para onde essas palavras estão indo. Todo mundo é cheio de emoções mas a maior parte das pessoas se deixa levar pela insegurança e pelo medo. Dois sentimentos capazes de transformar qualquer um em metade. E de que vale viver pela metade? De que vale escolher o medo por não conhecer o dia seguinte. As pessoas cismam em acreditar que existe amanhã. Uma bobagem. O amanhã não existe e o ontem já morreu. Nossa única escolha possível é viver o hoje. É nele que estão os prazeres da vida. É nele que estão todas as possibilidades do mundo, sejam: profissionais, emocionais, carnais, profanas ou divinas. É no hoje que tudo acontece.

A morte do meu pai mexeu muito comigo. Ver meu pai morto e entender que nunca mais nos falaríamos para contar histórias tolas do dia-a-dia doeu muito. Saber que não poderia mais lhe pedir conselhos e escutar suas opiniões sempre fortes e sempre inteligentes me entristece. Sinto até hoje a falta de sua presença, do seu cheiro, do seu carisma, da sua inteligência e de tudo mais que fez dele a pessoa que ele foi e de mim a pessoa que tento ser.

Ver a morte tão de perto me mostrou que o tempo está sempre correndo. Fui tomado de pressa. Pressa de realizar, de amar, de sorrir mas principalmente  pressa de viver. Não sei se todo mundo é assim. Pra mim a vida ganhou outra dimensão depois da morte de meu pai. Amo a vida, amo fazer as coisas que gosto e compartilhar isso com amigos e mesmo com pessoas que nunca vi antes. Ontem mesmo, numa mesa de botequim conheci um casal bacana e logo estávamos sentados juntos, rindo e falando trivialidades entre um chopp e outro. Que delícia. Que gostoso que é poder me permitir e ter a sorte de ter amigos que gostam tanto disso quanto eu.

A vida é cheia de surpresas mas elas não vão bater na minha porta. Elas estão nas ruas, nos bares, nos restaurantes, na praia, nas viagens e em muitos outros lugares... surpresas não gostam de ficar presas em um só lugar esperando para serem descobertas. Surpresas são para quem gosta de viver. Eu adoro surpresas.

E, quando vejo as pessoas sempre dispostas a falar alguma coisa da minha vida, entendo que isso faz parte de uma necessidade humana de tentar se compreender nos outros. O Arthur da Távola (acho que foi ele) escreveu um livro do qual só lembro do nome: Os Outros São Eu. Li mais vezes o título desse livro do que qualquer outro na vida e depois, toda vez que começava a tentar ler o livro, achava-o muito chato e o deixava para depois. Mas esse título é incrivelmente verdadeiro.

E segue o baile...

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Quero, Quero - Claudio Nucci (1980)

Fiquei com essa música na cabeça....risos... e lá se vão 32 anos...

Meu Pai


Pensando no meu pai. Lembrei de postar aqui o texto que escrevi e distribuímos na sua missa de sétimo dia. A perda dele foi a minha maior incompetência emocional, sem nenhuma dúvida.

MEU PAI 

Quando meu avô Luiz morreu, escrevi um texto comovido colocando para fora todo o meu sentimento. Meu Pai o compartilhou com seus amigos, nossa família e com diversas pessoas que não conheci, não sei quem são, jamais saberei.

Hoje, após o funeral do meu próprio Pai fiquei sem palavras, sem rumo , sem norte. Não há como escrever, não há como falar. Há que se lembrar. Há que se ouvir histórias das pessoas que se aproximaram. Há que se ouvir lembranças dos que lembraram. E não foram poucos.

Sempre tive medo desse dia. Sempre temi que meu telefone tocasse para que alguém me dissesse que meu Pai havia morrido. Mas esse dia chegou: morreu meu Pai.

Eu e meu irmão não o chamávamos de papai. Sempre foi “meu” Pai, com o pronome possessivo na frente porque sempre dividimos o nosso Pai com outras pessoas. Ele foi nosso Pai amado, e foi Pai dos próprios pais, foi Pai dos irmãos, foi Pai dos amigos e Pai de tantos mais que passaram pelo seu caminho.

Foram tantas as pessoas que se apresentaram em seu funeral para nos dizer que meu Pai também era seu Pai que ao final do dia, eu e meu irmão (só meu) comentamos: - Quantos irmãos! Quantas pessoas sofrendo a mesma falta paterna que nos dói tanto.

Inúmeras pessoas me disseram: - força!

Entendo como um carinho de quem vê um filho chorando a morte do próprio Pai, junto ao seu caixão. Mas sou forte e meu irmão ainda mais forte. Estamos juntos, todos juntos, do jeito que ele sempre fez acontecer. Minha família sempre se reuniu ao seu redor, mesmo nas tantas vezes em que ele conseguiu fazer isso parecendo que a razão fosse outra.

Sou forte. Sou filho de um homem forte que poderia ter ido além, que poderia ter feito mais, que poderia ter se destacado ainda mais se não tivesse escolhido seus amigos e sua família como a prioridade absoluta da sua vida. Se meu Pai fosse mais egoísta talvez fosse um político, mas ele sempre preferiu gastar sua política para aproximar as pessoas, os filhos, os amigos, os irmãos e principalmente seus pais.

Sou forte. Tenho uma filha e duas sobrinhas que choram forte a perda de seu avô querido, com a certeza de que ele foi o melhor avô que poderiam ter tido. Cheias de lembranças que levarão para sempre.

Sou forte. Tenho um irmão querido, capaz de cuidar do meu choro antes de pensar no próprio choro. Capaz de cuidar do próprio Pai como se fora seu filho.

Sou forte. Tenho uma mãe amada. Minha mãe. Que está sempre ao meu lado, sem me julgar, sem me culpar, sem censurar.

Sou forte. Tenho tios como quem tem irmãos, filhos do mesmo Pai. O mesmo Carlos de Figueiredo Forbes que nos cuidou a todos. Que nos amou a todos e que nunca pediu nada em troca a não ser amor. Diferente de mim, meu Pai não declarava seu amor as pessoas. Mas posso dizer, com toda a segurança que ele me ensinou a ter, que ele amou muito todos os seus amigos, todos os seus sobrinhos, suas mulheres, seu netos, seus filhos, seus pais e principalmente seus irmãos.

Sou forte. Porque meu Pai acreditava em Deus, me ensinou a hierarquia dos anjos. Me falou dos santos de sua devoção. Me levou tantas vezes à igreja para rezarmos juntos. Rezou por mim tantas vezes nas suas preces.

Sou forte. Levantei infinitas vezes em defesa do meu Pai contra quem fosse. Levantarei sempre.

Sou forte. Vejo amigos, parentes, irmão e irmãos reunidos para um último adeus.

Sou forte. Porque sou Forbes. Porque tenho nas minhas veias o sangue do homem que mais amei em toda a minha vida. Meu Pai, Carlos de Figueiredo Forbes.

Sou forte. Acredito que meu Pai está ao lado de Deus Pai. E porque ficou mais fácil acreditar na oração que Jesus ensinou e que quero convidá-los a rezar comigo:

Pai nosso, que estás no céu. Santificado seja o vosso nome. Venha a nós o vosso reino. Seja feita a vossa vontade, assim na terra como no céu. O pão nosso de cada dia nos dai hoje. Perdoai-nos as nossas ofensas assim como perdoamos a quem nos tem ofendido. Não nos deixei cair em tentação, mas livrai-nos de todo mal. Amém.

Não tenho tempo a perder...

O baile segue... pra variar errei na mosca de novo. Sou bom nisso. Na verdade acho que me deixo seduzir muito fácil. Olho nos olhos e acredito que a pessoa que estou vendo lá no fundo é de verdade. Acabo esquecendo que 99,9% das pessoas não tem coragem de ser o que são. E, por conta disso, criam as personagens que usam o tempo todo.

Dessa vez a personagem escolhida foi a "Menina Mimada"... o encanto se foi mais rapidamente do que chegou...

Enfim, ficam os bons momentos de uma pessoa que passou rápido como um trem bala pela minha vida e a torcida para que a infantilidade emocional da moça não se reflita em provocações desnecessárias nas redes sociais da vida e nem no desnecessário remorso traduzido em frases estúpidas distribuídas por aí. Torço para que ela encontre outro personagem que encaixe na vida que ela idealizou e que isso seja o início de uma linda novela que ela, e a maior parte das pessoas do mundo, chamam de vida...

A minha não é novela e não tenho tempo pra perder.

Desabafo: tô cansado de gente que me idealiza de um jeito que eu não sou, não se preocupa em saber quem eu sou de verdade e ainda se dá o direito de me julgar e querer me mudar...

Segue o baile...

domingo, 10 de junho de 2012

Mudando o Rumo dessa Prosa

Bom... acho que a minha incompetência tá cada vez mais no passado e por isso mesmo é sobre ele que vou falar agora no blog. Vou viver a minha competência e lembrar das incompetências que me trouxeram até aqui, mas é claro que se tudo der errado volto aos dias de hoje..risos... Combinado? Tranquilo? Então até amanhã!

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Vem Dançar Comigo

A moça que chamei de "a primeira", algumas histórias atrás, me apareceu de novo. Na verdade, ela sequer chegou a ir embora, mas apareceu diferente e me fez sentir diferente e por isso resolvi escrever. Vou chamá-la de Menina do Rabo-de-Cavalo.

A Menina do Rabo-de-Cavalo é certamente das mulheres mais bonitas que conheci na vida. Alta, esguia, de bem cuidados cabelos morenos, dona de um cheiro delicioso e um porte raro. Mulher com porte é diferente. Na minha vida, antes da Menina do Rabo-de-Cavalo, conheci três mulheres com porte capazes de me impressionar da mesma forma.

A primeira foi minha avó. Que mulher chique, que porte impressionante e quanto carisma havia naquele doce coração de avó. Sua vida não foi fácil. Teve três filhos mas apenas minha mãe sobreviveu. Passou muito da sua vida sofrendo a perda dos outros dois e arcando com as consequências da sua tristeza. Quando ganhou netos ganhou também um novo sopro de vida. Era avó em tempo integral, capaz de sair de São Paulo para as temporadas em que meus pais viajavam para o exterior apenas para cuidar da nossa diversão. A favorita era alagar o banheiro de minha mãe, espalhar sabão ou shampoo pelo chão e deslizar de barriga de um lado para o outro. Ela apenas colocava um banco na porta do banheiro e assistia meu irmão e eu rindo da brincadeira proibida pela minha mãe e liberada por ela, a avó mais doce do mundo. Sua outra especialidade era montar as maquetes da revista Recreio da nossa infância. A revista vinha com diversos elementos para recortar e montar em um painel central. Sem a minha avó, nunca chegamos a montar um inteiro com ela, quando voltávamos do colégio, tínhamos um novo tesouro perfeita e cuidadosamente montado. Bons tempos.

A segunda mulher de porte raro é minha mãe. A única mulher que conheço que é charmosa até de pijamas. Capaz de ser notada em qualquer ambiente apenas por estar lá. O trato que ela sempre dedicou a si mesma e as coisas que viu e aprendeu com minha avó, fizeram dela a mulher mais elegante que eu jamais conheci. E essa não é apenas a opinião de um filho apaixonado pela própria mãe. É senso comum entre todos que a conheceram. Mamãe é impressionante em qualquer lugar, seja no melhor restaurante de Nova York ou num pé-sujo do Leblon. Faz parte da sua elegância a generosidade que ela usou a vida inteira para dedicar atenções e mesuras a quem quer que ela julgasse merecedor, fosse uma personalidade importante ou o filho de um porteiro. A nobreza do seu porte se traduziu sempre nos seus atos nobres e autênticos.

A terceira foi minha ex e querida mulher. Tão morena, esguia, charmosa e bem cuidada quanto a Menina do Rabo-de-Cavalo, a mãe da minha filha amada sempre teve seu porte impressionante. Sempre soube se vestir, se produzir e se fazer notar em qualquer lugar que fosse e sempre tive orgulho disso nela. Por vezes brinquei de "boneca" com ela, por exemplo, quando passávamos em frente a uma loja e eu via uma roupa que me parecia perfeita para ela. Eu a fazia entrar e ela sempre dizia que achava que não ficaria bem mas sempre se rendia ao meu apelo para que experimentasse e sempre saía do provador linda e encantada com minha descoberta. Adorávamos essa cumplicidade de gostos e o prazer compartilhado. Uma linda mulher essa minha ex e querida ex-mulher.

Mas o assunto é a Menina do Rabo-de-Cavalo. Ontem combinamos um cinema de surpresa. A chuva convidava cada um de nós a permanecer na própria cama e nos dava disposição apenas para uma rápida produção de pipocas, talvez um vinho e logo uma imersão sob um edredon macio. Havíamos combinado de nos falarmos no final do dia e quase desistimos de fazer algo porque o sono tomava conta dos dois. Mas, em algum momento, a vontade de estar por perto veio mais forte e acabamos combinando um cinema. Fui buscá-la em casa pensando se era mesmo um cinema o que eu queria fazer. E ela entrou no carro dizendo: - Tenho uma ideia... e eu respondi: - Aonde você quer jantar... e ela riu porque ela também tinha pensado como eu em uma alternativa ao cinema.

Fomos ao Hansl, um lugar da minha mais tenra adolescência, feito para casais comerem fondue enquanto trocam carinhos e observam a vista mais linda que o Rio de Janeiro tem a oferecer. Sentamos em uma mesa no fundo e fomos um dos primeiros casais a chegar no restaurante. Cheguei a acreditar que não haveria muita gente frequentando o lugar, mas me enganei. O lugar encheu-se de outros casais e os garçons foram acendendo as velas das mesas a medida que eles chegavam.

Sentei-me ao lado da Menina de Rabo-de-Cavalo por recomendação do garçom. Ri da deselegância mas gostei de ficar perto dela. Seu cheiro me encanta. Ficamos conversando e rindo e nos divertindo muito por conta das tantas coisas que temos em comum e também das coisas em que somos opostos. Havia um clima de romance no ar, sem que no entanto a Menina do Rabo-de-Cavalo baixasse sua guarda em momento nenhum, nem mesmo com o bom Carmenere que nos fez companhia.

Não pude resistir ao jogo de sedução em que entrei sem me censurar. Pequenos gestos, palavras e frases ditas para surpreender cumpriram seu papel mas ela resistiu a todos os gestos e a todas as palavras sem que isso se transformasse em uma situação desagradável de mal-estar. Estávamos muito bem, na verdade. A insegurança e o medo dela não são contagiosos e por isso segui sedutor ainda que a sedução não tenha me levado a lugar algum.

A Moça do Rabo-de-Cavalo gosta de falar de suas experiências anteriores. De como um fez, de como o outro reagiu, do que um trouxe para a sua vida, do que outro fez para quebrar sua resistência e por aí vai. Tudo me parecia um curso rápido e avançado de paciência para a conquista. Ri muito com a situação. Percebi que era um ballet. Ela num solo lindo mostrando como gosta de dançar e eu, observador e bom aluno, decorando os passos a cada movimento. Ela me dizia, em tom de defesa, como somos diferentes e tudo mais que já sabia que ouviria dela e eu seguia, com o sorriso no rosto, ouvindo verdades prontas da moça que não me conhece.

Disse, como não poderia deixar de dizer, que o que eu estava vendo era apenas um menina com medo e que apesar do porte, das experiências anteriores, das ressalvas, das palavras e de tudo mais o que realmente me impressionava nela era o rabo-de-cavalo. Era nele que eu via a menina que me encantava e não em todo o resto que ela dedicou tantos anos para construir. O rabo-de-cavalo mostrava a menina de verdade e era só o que me interessava.

Fui levá-la em casa e, durante todo o caminho, seguimos com o mesmo clima de romance no ar sem que a noite se transformasse em um beijo. Gostei muito mais dessa noite do que se tivesse compartilhado apenas carinhos carentes e beijos sem paixão com qualquer outra pessoa.

Fui dormir feliz, com a sensação de que fui tirado para dançar. E segue o baile...

Menina Sorriso

Eu estava no samba quando um sorriso iluminou a noite.

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O samba é a manifestação musical mais autêntica que eu conheço. Adoro ver as pessoas se transformando em cantores e ritmistas ao som de qualquer cavaquinho, de qualquer surdo, de qualquer tamborim. Descobri o samba ainda novo. O gosto musical do meu pai teve em mim uma imensa influência, principalmente pelo seu ecletismo. Papai adorava as manhãs de domingo. Ele acordava e ia para a sala com os discos comprados na Gramophone no dia anterior e começava a gravar as fitas cassete que ele escutaria durante a semana no vai e vem do escritório para seus restaurantes preferidos e para casa e também as fitas com que ele presentearia as amigas da vez. Meu pai era um sedutor e seduzia com a música de uma forma brilhante.

Eu acordava com a música alta e levantava em busca daquele som que me levaria a meu pai. Aquela sala de estar virava minha sala de aula e meu pai, meu professor. A cada música, um comentário, sempre com alguma informação surpreendente. Coisas como: - Fulano gravou essa música em resposta a uma provocação feita por sicrano e descobriram que essa "briga" vendia muito mais discos do que a falta dela. E a partir de então compuseram, cada um, cerca de 10 músicas, todas de sucesso e todas comemoradas pelos dois amigos juntos com muito whisky em algum bar da cidade. E ria das histórias que ele regava com charme e inteligência enquanto contava para o filho que sorria de orgulho e de amor por aquele homem tão único.

Entre as músicas clássicas, o jazz, o folk americano e tantos outros estilos surgia invariavelmente o samba. E eu era tão menino que não tinha tido tempo de criar preconceitos idiotas. Ouvia, aprendia, sorria e aproveitava as lições de todos os finais de semana. E foi assim que comecei a conhecer e a gostar do ritmo mais brasileiro que existe.

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Naquela noite de domingo, em um samba no Leblon, fiquei por perto da roda formada por músicos tão queridos que já haviam se tornado amigos. Soltava minha voz no meio de tantas outras com medo de errar a letra e gingava (duro) sem sair do lugar. Foi quando um sorriso iluminou a noite e minha atenção deixou o samba para olhar a menina que sorria seu sorriso lindo.

Perdi completamente a concentração no samba. Aquele sorriso era encantador demais e minha cabecinha de poeta foi atraído para ele e sua dona como um metal é atraído para um imã. Curti os momentos que antecedem a corte, tracei uma reta para a moça sem pensar no que eu faria e, na sua frente, disse: - Boa noite, sabe o que é? Alguém precisa dizer hoje que você é linda! e me apresentei e saí deixando a moça com o sorriso no rosto pensando na frase dita de um só fôlego pelo menino-poeta que vive em mim.

Ainda naquela noite, fomos apresentados e conversamos e continuamos conversando depois pela internet dos nossos tempos, ainda que de forma esparsa e sem expectativas de lado a lado. Passei a chamá-la de "Menina Sorriso".

Os dias passaram e em um deles descobrimos que haveria outro samba e combinamos de nos encontrar lá. E nos encontramos e gostamos de estar juntos e combinamos um cinema para depois e fomos. Eu a assisti mais do que ao filme e ela sentiu meu olhar queimando seu rosto e nos encantamos um com o outro de um jeito lindo, simples e verdadeiro.

O sorriso dela e o meu se transformaram em pura alegria e imenso prazer de estarmos juntos.

A Menina Sorriso me tomou de assalto e preencheu todos os meus vazios de forma rápida e intensa. Irresistível para o meu menino-poeta, sempre em busca da intensidade dos dias e das noites. Ela apresentou a ele novos sambas e velhos sambistas. Encheu sua vida de atividades sociais que iam de uma visita a Cadeg até um encontro na Pedra do Sal, berço do samba carioca, passando por viagens, exposições, almoços, bares, cinemas, shows e qualquer outra atividade que pudesse ter chamado a atenção dos dois.

Foram meses felizes. Mas o destino não os queria juntos ou, pelo menos, não daquela forma e a paixão avassaladora se transformou em uma linda amizade e no mais simples e mais importante bem-querer que pode haver entre duas pessoas.

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Ainda ontem encontrei a Menina Sorriso e fiquei feliz por ela existir e por continuar sorrindo.