sexta-feira, 8 de junho de 2012

Vem Dançar Comigo

A moça que chamei de "a primeira", algumas histórias atrás, me apareceu de novo. Na verdade, ela sequer chegou a ir embora, mas apareceu diferente e me fez sentir diferente e por isso resolvi escrever. Vou chamá-la de Menina do Rabo-de-Cavalo.

A Menina do Rabo-de-Cavalo é certamente das mulheres mais bonitas que conheci na vida. Alta, esguia, de bem cuidados cabelos morenos, dona de um cheiro delicioso e um porte raro. Mulher com porte é diferente. Na minha vida, antes da Menina do Rabo-de-Cavalo, conheci três mulheres com porte capazes de me impressionar da mesma forma.

A primeira foi minha avó. Que mulher chique, que porte impressionante e quanto carisma havia naquele doce coração de avó. Sua vida não foi fácil. Teve três filhos mas apenas minha mãe sobreviveu. Passou muito da sua vida sofrendo a perda dos outros dois e arcando com as consequências da sua tristeza. Quando ganhou netos ganhou também um novo sopro de vida. Era avó em tempo integral, capaz de sair de São Paulo para as temporadas em que meus pais viajavam para o exterior apenas para cuidar da nossa diversão. A favorita era alagar o banheiro de minha mãe, espalhar sabão ou shampoo pelo chão e deslizar de barriga de um lado para o outro. Ela apenas colocava um banco na porta do banheiro e assistia meu irmão e eu rindo da brincadeira proibida pela minha mãe e liberada por ela, a avó mais doce do mundo. Sua outra especialidade era montar as maquetes da revista Recreio da nossa infância. A revista vinha com diversos elementos para recortar e montar em um painel central. Sem a minha avó, nunca chegamos a montar um inteiro com ela, quando voltávamos do colégio, tínhamos um novo tesouro perfeita e cuidadosamente montado. Bons tempos.

A segunda mulher de porte raro é minha mãe. A única mulher que conheço que é charmosa até de pijamas. Capaz de ser notada em qualquer ambiente apenas por estar lá. O trato que ela sempre dedicou a si mesma e as coisas que viu e aprendeu com minha avó, fizeram dela a mulher mais elegante que eu jamais conheci. E essa não é apenas a opinião de um filho apaixonado pela própria mãe. É senso comum entre todos que a conheceram. Mamãe é impressionante em qualquer lugar, seja no melhor restaurante de Nova York ou num pé-sujo do Leblon. Faz parte da sua elegância a generosidade que ela usou a vida inteira para dedicar atenções e mesuras a quem quer que ela julgasse merecedor, fosse uma personalidade importante ou o filho de um porteiro. A nobreza do seu porte se traduziu sempre nos seus atos nobres e autênticos.

A terceira foi minha ex e querida mulher. Tão morena, esguia, charmosa e bem cuidada quanto a Menina do Rabo-de-Cavalo, a mãe da minha filha amada sempre teve seu porte impressionante. Sempre soube se vestir, se produzir e se fazer notar em qualquer lugar que fosse e sempre tive orgulho disso nela. Por vezes brinquei de "boneca" com ela, por exemplo, quando passávamos em frente a uma loja e eu via uma roupa que me parecia perfeita para ela. Eu a fazia entrar e ela sempre dizia que achava que não ficaria bem mas sempre se rendia ao meu apelo para que experimentasse e sempre saía do provador linda e encantada com minha descoberta. Adorávamos essa cumplicidade de gostos e o prazer compartilhado. Uma linda mulher essa minha ex e querida ex-mulher.

Mas o assunto é a Menina do Rabo-de-Cavalo. Ontem combinamos um cinema de surpresa. A chuva convidava cada um de nós a permanecer na própria cama e nos dava disposição apenas para uma rápida produção de pipocas, talvez um vinho e logo uma imersão sob um edredon macio. Havíamos combinado de nos falarmos no final do dia e quase desistimos de fazer algo porque o sono tomava conta dos dois. Mas, em algum momento, a vontade de estar por perto veio mais forte e acabamos combinando um cinema. Fui buscá-la em casa pensando se era mesmo um cinema o que eu queria fazer. E ela entrou no carro dizendo: - Tenho uma ideia... e eu respondi: - Aonde você quer jantar... e ela riu porque ela também tinha pensado como eu em uma alternativa ao cinema.

Fomos ao Hansl, um lugar da minha mais tenra adolescência, feito para casais comerem fondue enquanto trocam carinhos e observam a vista mais linda que o Rio de Janeiro tem a oferecer. Sentamos em uma mesa no fundo e fomos um dos primeiros casais a chegar no restaurante. Cheguei a acreditar que não haveria muita gente frequentando o lugar, mas me enganei. O lugar encheu-se de outros casais e os garçons foram acendendo as velas das mesas a medida que eles chegavam.

Sentei-me ao lado da Menina de Rabo-de-Cavalo por recomendação do garçom. Ri da deselegância mas gostei de ficar perto dela. Seu cheiro me encanta. Ficamos conversando e rindo e nos divertindo muito por conta das tantas coisas que temos em comum e também das coisas em que somos opostos. Havia um clima de romance no ar, sem que no entanto a Menina do Rabo-de-Cavalo baixasse sua guarda em momento nenhum, nem mesmo com o bom Carmenere que nos fez companhia.

Não pude resistir ao jogo de sedução em que entrei sem me censurar. Pequenos gestos, palavras e frases ditas para surpreender cumpriram seu papel mas ela resistiu a todos os gestos e a todas as palavras sem que isso se transformasse em uma situação desagradável de mal-estar. Estávamos muito bem, na verdade. A insegurança e o medo dela não são contagiosos e por isso segui sedutor ainda que a sedução não tenha me levado a lugar algum.

A Moça do Rabo-de-Cavalo gosta de falar de suas experiências anteriores. De como um fez, de como o outro reagiu, do que um trouxe para a sua vida, do que outro fez para quebrar sua resistência e por aí vai. Tudo me parecia um curso rápido e avançado de paciência para a conquista. Ri muito com a situação. Percebi que era um ballet. Ela num solo lindo mostrando como gosta de dançar e eu, observador e bom aluno, decorando os passos a cada movimento. Ela me dizia, em tom de defesa, como somos diferentes e tudo mais que já sabia que ouviria dela e eu seguia, com o sorriso no rosto, ouvindo verdades prontas da moça que não me conhece.

Disse, como não poderia deixar de dizer, que o que eu estava vendo era apenas um menina com medo e que apesar do porte, das experiências anteriores, das ressalvas, das palavras e de tudo mais o que realmente me impressionava nela era o rabo-de-cavalo. Era nele que eu via a menina que me encantava e não em todo o resto que ela dedicou tantos anos para construir. O rabo-de-cavalo mostrava a menina de verdade e era só o que me interessava.

Fui levá-la em casa e, durante todo o caminho, seguimos com o mesmo clima de romance no ar sem que a noite se transformasse em um beijo. Gostei muito mais dessa noite do que se tivesse compartilhado apenas carinhos carentes e beijos sem paixão com qualquer outra pessoa.

Fui dormir feliz, com a sensação de que fui tirado para dançar. E segue o baile...

Nenhum comentário:

Postar um comentário