terça-feira, 10 de julho de 2012

Amar se aprende amando



Você conhece alguém que consiga definir o amor? Essa é das tarefas mais difíceis que eu conheço. Porque o que eu entendo por amor não é o que você entende por amor. As coisas que me fazem dizer que estou amando são diferentes das que convencem você da mesma coisa.

Pra mim, amar implica em querer estar junto o tempo todo e em querer dividir todos os momentos com a outra pessoa sem nenhuma mentira e sem nenhum pudor. Quando isso acontece surge um dos mais importantes ingredientes de uma relação de sucesso: a cumplicidade. A deliciosa sensação de que basta um olhar e tudo o que precisava ser dito já foi entendido pela outra pessoa.

O olhar. Ele é responsável por 99,99% das vezes em que eu me apaixonei por alguém. Não é o meu olhar sobre outra pessoa é a troca. É no momento em que os meus olhos encontram os olhos dela que eu consigo sentir melhor. Fico com a sensação de que é possível entrar de fato dentro de outra pessoa pela tal “janela da alma” (cafona isso, né?). Minha receita de amor sempre começa com os olhos nos olhos. É como um gatilho. Um momento muito rápido em que eu percebo que poderia amar aquela pessoa. Mas é assim mesmo que funciona comigo.

Claro que já me apaixonei por pessoas que eu já tinha visto antes, mas isso só pode ter acontecido se eu não tiver me permitido olhar antes. Se não olhei, não me dei conta de que seria possível amá-la. E pode ter sido por qualquer razão. Pode ser que eu estivesse apaixonado por outra pessoa quando a conheci. Pode ser porque a relação era distante ou profissional e não imaginei outra possibilidade, pode ser pelo que for. Mas uma vez que os olhos se encontram e conversam entre si não há mais o que fazer. O amor invade.

Ontem mesmo estava cantarolando, sem amar: Quando a luz dos olhos meus e a luz dos olhos teus resolvem se encontrar... Essa música me acompanhou em quase todos os meus primeiros amores. Ouvia o disco gravado ao vivo no Canecão, com Tom e Miucha cantando lindamente, e me deixava levar pelas doces sensações que os acordes me provocavam. Bom demais os amores da juventude, sem limites, sem razão, eternos e imensos. Bom demais.

Mas o olhar não basta. Ele é só o início, a chave que abre o coração, mas não é tudo. Depois dele vem a troca. O olhar justifica o início de uma boa conversa e isso também é fundamental para saber quais as chances de um amor nascer dali. Quando o papo flui fácil o amor tem mais chances de sair do mundo de Platão para o mundo real (ou nem tão real assim). Um pouco antes de começar uma conversa dessas tento me colocar no lugar da outra pessoa. Já nos primeiros olhares tento ver o que pode haver do lado de dentro dela e o que pode realmente me encantar, me despertar, me modificar, justificar minha entrega. O poetinha dizia que havia uma voz íntima lá dentro no poema “O Haver” quando narra o tudo que resta de um momento de amor.

A troca estabelece os limites e as condições para que ali nasça um grande amor. Não basta falar, berrar, gritar, dizer tudo aquilo que você quer e pensa em dizer. Não adianta nada colocar para fora toda a excitação de menino apaixonado se não houver troca. Cuidado. Se você falar sozinho, se optar por confessar que está nascendo um amor dentro de você e que você não quer e não vai controla-lo de forma alguma, possivelmente afastará a outra pessoa. Porque as pessoas já sofreram antes de conhecer você, porque as pessoas tem medo e se entregam ao medo com muito mais dedicação do que se entregarão a você. Não há nenhuma possibilidade de criar um amor sozinho. Amor é feito aos pares, em duplas, na soma de dois, sempre dois.

A troca é a soma de dois. É como a fé que não se explica, mas se sente (ou não). Para amar, os dois precisam acreditar que é possível amar. Os dois precisam mirar um ponto comum e lá devem depositar tudo o que sentem um pelo outro. Assim nasce algo maior que os une. O amor é a soma dos amores que não existem sozinhos, mas existem na forma de querer e de desejar dentro de você. Sem troca não há amor. Sem soma não há amor.

Mas ele, sua santidade o amor, não é bolo que tenha receita pronta ou que possa ser vendido nas prateleiras dos supermercados da vida. O amor ganha vida própria e, como um filho, precisa ser nutrido todos os dias, precisa de cuidados e precisa de muita atenção. Isso não pode ser difícil nem doloroso. Isso passa pela entrega de ambos e por uma negociação sem fim que vai determinar até onde você está disposto a seguir junto.

Se você mimar demais o amor sem nunca lhe dizer não, vai acabar aturando uma criança chata e cheia de vontades. Não reclame: foi você quem fez isso. Se você for um pai ou uma mãe muito rígido com o amor vai ver que ele se afastará de você e buscará outro pai ou outra mãe mesmo que ele resolva não deixar de existir. Não reclame: foi você quem fez isso. Se você escolher dar ao outro o controle total da criação, ela vai se ressentir da sua ausência e isso é para sempre. Não reclame.

Acho graça das pessoas que precisam definir o que é o amor. Que estabelecem como verdade absoluta as impressões que possuem de tudo o que já sentiram, viram e viveram. Não faltam definições, mas elas não servem de nada porque o meu amor não tem nada a ver com o seu amor a menos que nós dois o tenhamos criado juntos. O amor é indefinível porque são muitos.

É daí e da incompetência de perceber o que é comum e o que não é que surgem as frustrações. Assim como um pai imagina um futuro para o filho diferente do que a mãe imagina também assim também pode acontecer com o amor. E por isso os olhares e as trocas são tão importantes. Casais que não se olham não se amam. Casais sem troca não se sustentam.

E como qualquer pessoa o amor que nasce também cresce, adolesce, amadurece e envelhece. Se ele vai passar por todas as fases com saúde? Isso só depende de quem cuida dele.

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