sexta-feira, 13 de julho de 2012

Vai ser uma longa noite...


- Ei, aonde é que você pensa que vai vestida assim?
- Mas mãe, estou de jeans e camiseta. Qual a implicância agora?

E ela teve que ouvir da mãe que se ela saísse daquele jeito não teria muitas chances na noite. Imagina se algum rapaz se interessaria por uma moça de jeans e camiseta. Disse já se levantando e tomando o rumo do seu próprio armário em busca de uma roupa mais adequada para a filha tão querida.

Foi o tempo necessário para ela buscar a saída, chamar o elevador e bater a porta de casa com barulho suficiente para a mãe entender que ela já tinha ido.

...

Era uma sexta-feira como qualquer outra. Ela estava indo para um bar encontrar-se com os amigos e com os amigos dos amigos para depois seguirem para uma boate da moda. Alguns estavam do lado de fora, fumando, e ela chegou com uma cara triste que não passou despercebida.

- O que houve?
- Minha mãe. Que mania de tentar me fantasiar de uma coisa que eu não sou. Saco! Mãe é um saco!

E as meninas riram e amenizaram a situação perguntando se aquela irritação toda era só por causa de um casaquinho que ela se recusara a levar para a noite. Não era. Mas a noite estava só começando e ela entrou junto com os fumantes para a mesa grande onde se reuniam mais de vinte jovens como ela.

Quase todos os rostos da mesa eram conhecidos. Havia, no entanto, dois rapazes que ela não conhecia. Primos de um conhecido, alguém simplificou. Um deles parecia saído de um filme de ação dos anos 90. A produção do cara incluía uma jaqueta de couro, um relógio incrível, um corte de cabelo bem ousado e até mesmo óculos escuros, que ela pensou ser um exagero. De qualquer jeito ele se comportava como “o” cara, tanto que ela mal percebeu o outro rapaz que usava apenas uma calça jeans surrada e uma camiseta branca.

Um chopp. Dois chopps. Três chopps. Até que alguém diz: - Galera, tá na hora. Vam’bora!?!

Conta paga e todos se organizam para pegar os primeiros táxis que passassem, já que o ponto, como sempre, estava vazio. O bonitão recém-chegado ao grupo fecha sua jaqueta de couro e saca o capacete de uma linda moto estacionada em frente ao bar. Abre o bagageiro e tira outro capacete e levanta os óculos olhando para ela, oferecendo o capacete como uma espécie de senha para a carona. Ela havia sido a escolhida e ficou feliz com isso.

- Você tá bem pra dirigir a moto? – ela perguntou, já acomodada na garupa, antevendo o prazer de segurar na cintura do rapaz que não passava despercebido.
- Estou ótimo e a noite está só começando gatinha.

“Gatinha?”, “Gatinha?” Fala sério. Ele não só parecia saído de um filme antigo como falava do mesmo jeito dos caras por quem a sua mãe babava nos DVDs preferidos. Ela riu, mas só por dentro pra não estragar o momento.

Como não podia deixar de ser, eles chegaram bem antes na boate. Ele desceu da moto e a ajudou a tirar o capacete já tendo tirado o seu. De um jeito que parecia ensaiado, ele conseguiu segurar os dois capacetes com uma mão e envolver a menina com a outra, puxando-a com firmeza para uma tentativa frustrada de um beijo.

- Opa... olha só eu não sei nem seu nome e não sou do tipo que sai beijando qualquer motoqueiro!

Ele manteve a pose cafajeste e disse apenas: - Que pena! Guardando em seguida os capacetes na moto, abrindo a jaqueta e arrumando os óculos enquanto passava os olhos no movimento da porta da boate em busca de uma presa nova. Ela riu de novo. Imaginou seriamente a possibilidade de vê-lo sacando do bolso de trás da calça um pente Flamengo (marca que seu porteiro usava) para ajeitar os cabelos milimetricamente preparados para a noitada.

Os amigos chegaram e a situação ficou mais leve. Mas ela já não estava mais a fim de passar a noite bebendo e dançando, ainda mais quando descobriu que era uma balada de música eletrônica. Ela avisou a todos que não ficaria e o motoqueiro fez uma pose ainda mais cafona, virando-se para ela, levantando os óculos novamente e dizendo: - Olha gata, não precisa ir embora por minha causa. E ela não se conteve.

- Ô John Travolta dos pobres, é o seguinte: não vou embora por sua causa, vou porque não tô a fim de ficar num lugar que mais parece uma vitrine de gente fantasiada de babaca que nem você. Fui clara!?

Tinha sido. O cara achou melhor baixar os óculos e tomar o rumo da entrada enquanto as amigas diziam que ela tinha pegado pesado. Ela se despediu se desculpando com todos e dizendo algo como: - Foi mal, mas hoje minha paciência tá curta. Em seguida fez sinal para um táxi que passava.

O outro rapaz que ela não conhecia abriu a porta do Santana (ela detestava táxi Santana, mas foi o que passou) e perguntou antes dela entrar: - Para onde você vai? Me dá uma carona? E foi entrando em seguida sem que ela pudesse responder. No táxi, pediu que o motorista os levasse para o Arpoador.

- Olha só. Seu amiguinho já estragou minha noite. Não tô a fim de me aborrecer de novo com ninguém, então: será que você se incomoda em me deixar em casa? E ele riu.

- Primeiro, ele não é meu “amiguinho”, também conheci o Tom Cruise hoje. Depois, não sei se você reparou, mas só nós dois estamos de jeans e camiseta. Quis sair de lá porque não tenho paciência para ficar numa balada com gente vestida de um jeito que não curte, se comportando de um jeito que não é, só pra ver se consegue ficar com alguém por quem eles não têm o menor interesse. E ela riu.

E o Santana seguiu rumo ao Arpoador. Ele fez questão de pagar, desceram e seguiram caminhando até as pedras que emolduram aquele canto na praia. Ele sorria e olhava para o mar, para o céu, para as pessoas que passavam e apenas sorria. Ela estava dividida. Não sabia se aproveitava a linda noite de lua cheia ou se tomava cuidado com o companheiro de indumentária.

- Você consegue sentir?
- O que?
- A mágica no ar? Você consegue perceber o momento? O cheiro bom que vem do mar, a luz boa que vem da lua, a brisa mansa que o vento traz.

Ela não respondeu. Ele perguntou:

- Posso fazer uma proposta?

Ele não esperava respostas, e continuou:

- Vamos passar a noite aqui, conversando até o nascer do sol?
- Por quê?
- Ora, porque esse dia vai emendar no outro dia que chega daqui a pouco e se não aproveitarmos o agora ele nunca mais vai voltar nem nos dar a chance de viver isso.

E ela riu, sentando em uma pedra, cruzando as pernas, tirando de vez qualquer armadura que pudesse estar usando e dizendo:

- É melhor você se sentar... essa vai ser uma longa noite.

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