sábado, 21 de julho de 2012

Uma Sequência de Mão.


Uma sequência de mão. Todas as cartas na ordem certa foram aparecendo na mão dele. Dez, valete, dama, rei e ás. Todas de copas menos a dama.

Aquele jogo já acontecia há muito tempo. Começava como brincadeira entre os amigos de sempre. Nenhum deles jogava se não fosse a dinheiro. Haviam aprendido cedo que se um jogo não fosse jogado com seriedade, não valia a pena ser jogado.

Na mesa, os cinco amigos encontravam seu passado, suas lembranças de infância. Conversavam as mesmas conversas de sempre. Sorriam das mesmas coisas de sempre. E sempre brincavam as mesmas brincadeiras. Aquele jogo de poker significava mais do que apenas mais um encontro. Era quase uma celebração, uma celebração à amizade.

Aquela noite não era diferente. Todos estavam, como sempre, felizes em se encontrar. Cada um era uma parte do outro. Juntos eram um só. E o jogo era o que os unia. Sentados na mesa redonda escolhiam seus lugares, não pela sorte mas por pequenas afinidades. De um lado da mesa ficavam os amigos fumantes. Um não gostava de sentar-se de costas para a porta, outro queria sempre ficar perto da cozinha, sua geladeira e suas cervejas. Os outros não tinham tantas preferências e cediam com mais facilidade.

O jogo começou com o embaralhar das cartas. Um corte. E cinco cartas jogadas na frente de cada um. O amigo do lado fazia a mesa e o seguinte dobrava a aposta. Os fumantes acendiam seus primeiros cigarros e todos levantavam, cada um do seu jeito, suas cinco cartas. Um arrumava o jogo levantando cada carta de uma vez. A outra reunia todas as cartas ao mesmo tempo e forçava uma a uma para o lado permitindo-se ver apenas o suficiente para reconhecer a figura e o naipe. Um olhava carta por carta sem colocá-las na mão e o outro alternava a forma de abri-las em busca da forma que lhe desse mais sorte.

As primeiras mãos mostravam um pouco do que havia de acontecer durante a noite. Quem estava com mais ou menos sorte. Quem estava pensando ou não em blefar. Que tipo de jogo seria aquele. Ele observava, como sempre, os gestos de cada um. Sabia que seu irmão jogava com inteligência e sabia que seus outros amigos jogavam em função da sorte.

Poucos jogos maiores deixavam o jogo mais calmo do que o normal. Um four valeria um prêmio de cada um dos jogadores, mas o four não acontecia. Um full-house ou qualquer jogo acima valeria a opção de pedir e escolher um jogo aberto na rodada seguinte e isso acontecia repetidamente.

As fichas seguiam de um lado para o outro da mesa, trocando de dono por diversas vezes. Ele estava numa noite inspirada. Contava piadas e bebia entre amigos. Seu jogo estava morno, mas ele sabia que haveria de receber uma mão especial. E esperava por ela.

De repente, cartas distribuídas. Uma sequência de mão. Todas as cartas na ordem certa foram aparecendo na mão dele. Dez, valete, dama, rei e ás. Todas de copas menos a dama. Ele tinha uma sequência de mão, mas não era isso o que ele via. Ele só pensava no Royal Street Flush que poderia fazer se trocasse a dama errada pela certa. Se o jogo entrasse, cada um dos companheiros de mesa lhe pagaria um cacife como prêmio além das fichas que estivessem em disputa.

Trocar ou não as damas? Essa era a questão que lhe afligia. Ele pensava que qualquer um no seu lugar seguiria em frente com o jogo de mão e, possivelmente, garantiria as fichas da mesa mostrando o jogo vagarosamente para criar nos outros a sensação que mistura ansiedade, medo e expectativas. Mas no final todos saberiam que o jogo não passava de um jogo mediano que não lhe dava sequer o direito de pleitear uma rodada de aberto. Ele pensava que seria tolo deixar passar a oportunidade de uma vida sem tentar. Um Royal não é um jogo que se faz todos os dias. Um Royal é motivo de comemoração, digno de registro e ele não abriria mão da chance de viver isso.

Apostas feitas e todos entraram no jogo. O primeiro a trocar cartas pediu apenas uma, o segundo pediu três, o terceiro disse não querer cartas. Ele trocou a sua e a dealer também pediu duas cartas. O jogo prometia disputa. O que não quis cartas abria um sorriso cínico no rosto como se já tivesse garantido sua mesa, os demais estavam concentrados torcendo para que o jogo de cada um entrasse. Ele, recebeu sua carta e a colocou no final das demais, abrindo novamente a coleção de cartas de copas, uma depois da outra, até chegar na última que ele puxava devagar, chorando a sorte – como diziam.

A primeira coisa que ele pode ver é que a carta era vermelha e isso era bom. Continuou puxando a carta enquanto os outros já se preparavam para apostar. O jogador que não pediu cartas fez uma puxada alta. Apostou quase meio cacife na mão que veio pronta. O do lado oposto passou antes da hora e ele seria o próximo a falar, mas ainda não havia acabado de abrir as cartas e ainda não conhecia sua sorte. Seguiu puxando e viu que a carta vermelha era uma dama e respirou aliviado. Havia garantido, pelo menos, uma nova sequencia. Mas ele ainda não vira o naipe.  E se aquela dama fosse de ouros? E se aquela dama fosse a errada? Os outros queriam pressa e ele pedia calma. Fechou o jogo e tornou a abri-lo com mais confiança. Agora ele puxava a dama vermelha por cima das demais em busca do naipe e quando a ponta do coração apareceu, ele apenas fechou o jogo, tomou um gole da cerveja e apostou sobre a aposta.

- Seu meio cacife, mais meio cacife. Determinou.

A jogadora que havia dado as cartas não se intimidou e disse que tinha que pagar para ver. O seguinte pulou fora. O que não quis cartas tornou a olhar seu jogo e depois seus amigos e disse que não só pagaria como aumentaria a aposta em mais meio cacife. Ele contou suas fichas e apostou todas de uma só vez.

A dealer pediu um novo cacife e pagou a aposta. O que não quis cartas também pagou e ele teria que mostrar seu jogo.

Abriu um imenso sorriso e atirou uma a uma as suas cartas sobre as fichas no meio do feltro verde. Primeiro o dez, o valete, pulou a dama, jogou o rei e o ás e por fim, beijou a dama de copas e a jogou dizendo: - Pedi e a dama que eu mais desejei na minha vida veio. Fiz um Royal Street Flush! E gritou de felicidade!!! Junto com a vibração dos demais. Ver um Royal na mesa é tão bom que ninguém se importava em pagar o prêmio e todos comemoravam juntos.

Era seu dia de sorte.

2 comentários:

  1. Interessante a sua crõnica, de autoestima.
    Parabens e bom fim de semana



    UM CONVITE ESPECIAL

    Vim cá, lê o seu blogue. Eu, tenho um. Muito simples, sem Cores e sem Nuances. Estou lhe convidando a visitar-me, e se possível, Seguirmos juntos por Eles. Estarei lhe esperando lá, afinal o que importa é a Amizade que fazemos e as publicações que expomos.



    Eu te Convido a vir Aqui www.josemariacosta.com

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    1. Obrigado José, vou visitar seu blog e seguimos nesse mundo virtual através das nossas incompetências! abs

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